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Eu me contradigo? Pois bem, eu me contradigo. Sou vasto, contenho multidões. (W.Whitman)

sábado, 30 de junho de 2012

Borderline

    O dia começa invariavelmente com aquela sensação de sonho. Um distanciamento da realidade que desde o despertar me põe numa bolha impermeável, impedindo o contato direto com a realidade. Faço um café, na esperança de que isso vai me deixar melhor mas parece não fazer nenhum efeito na minha disposição. Apanho um livro na estante, voltando em seguida ao leito. Uma música persiste na memória. Vou ao computador e seleciono o intérprete para tocar no player. A musica bendita não vem, me irrito e desligo tudo. Volto ao quarto e ao livro. Leio varios capítulos sem me concentrar verdadeiramente no enredo. Um olhar no relógio me diz que já é hora de almoço. Não tenho fome , mas mesmo assim resolvo que tenho de tomar banho e sair, ir ao supermercado, coisa que sempre reluto em fazer, não pelo trabalho de comprar coisas para meu sustento, mas sim pelo incômodo de ver  pessoas.
Depois de banho tomado, penteado minhas madeichas (cabelo grande e descuidado), vou para o sacrifício. Até que não é tão mal. Cumprimento com prazer os conhecidos que encontro. Até com alegria sinto o sol do meio dia, seu calor, a energia da rua ensolarada, a satisfação das pessoas em falar comigo. Vejo isso em seus rostos, radiantes ao me encontrar.
No mercado, compro pizza, verduras, legumes, tudo muito pouco, o suficiente para uma pessoa consumir por uma semana, ovos enfim, gosto de ovos fritos, e alguma cerveja. Essas na verdade, uma quantidade razoável para um fim de semana.
De volta ao lar. Abro a primeira antes de desembrulhar as compras e vou tomando ao mesmo tempo que lavo alfaces, rúculas, seleciono rabanetes para guardar, separo salsa para temperos futuros, e os tomates bem embrulhados num saco plástico para melhor conservação. Assim se vão as duas primeiras, com alegria, com a disposição de um noivo que tem como certo a felicidade depois do casamento. A pizza fica de prontidão, à espera para quando terei fome.
Ligo o computador na esperança de que tenha alí alguma coisa que me faça a vida mais estupenda, mais graciosa, mais interessante enfim, e em meio às midias sociais vou me entregando ao tédio da tecnocracia. Mais uma cerveja, duas, três, e o dia passa em frente ao monitor. Baixando musica que não terei tempo para ouvir, livros que nunca vou ler, informações que não vão realmente me servir de nada na segunda feira de sempre. Até que chega o crepúsculo. Crepúsculo que não vejo, afinal estou aqui ligado numa bela imagem de qualquer paragem num fim de mundo que não me diz respeito. Meu pôr-do sol, que deveria ser só meu, me passa despercebido e quando vejo já é noite.
Vou à geladeira e abro a décima cerveja; quando vou encher o copo no balcão, vejo que ja tenho outra aberta e ainda sem começar. Porra, me digo. Guardo-a com raiva e depois encho o copo com a que estava à espera. Acho engraçado, em silêncio, sem rir-me do fato. Tomo outro copo num trago e me da uma vontade de urinar. Me viro e abrindo o fecho da calça urino na lixeira da cozinha. Nem sei verdadeiramente o que faço. Cansado, me sento um pouco na cadeira e começo a cochilar. A cabeça pende sobre o peito e fico assim por um tempo indefinido. Acho que durmo mesmo, pois quando alarmado abro os olhos, consulto o relogio e percebo que se passou muito tempo. Tenho sono. Me levanto e vou ao quarto, onde me jogo na cama e adormeço.  

sábado, 2 de junho de 2012

Gostaria eu de voltar a escrever, mas algo me aconteceu e não mais concateno meus pensamentos; minhas ideias até fluem mas não as coordeno mais, me escapam sem controle e um lindo verso que poderia gerar um belo poema simplesmente desaparece em meio a um turbilhão de imagens confusas e quando o procuro, foi-se, não está mais la.
É uma agonia, é massacrante. Essas ideias me acometem pela madrugada e depois não consigo mais dormir. Me assaltam no meio do dia e naquele momento são de uma clareza cristalina, para logo depois desvanecerem-se como fumaça ao vento. Havia algo em mim que solidificava essas imagens antes de transpô-las ao papel. Esse algo perdeu-se. Era a argamassa que unia as frases, e do conjunto fazia o edifício, pequeno que fosse, mas habitável. Não tenho mais isso, como o confeiteiro que perdeu a mão para fazer seus quitutes. Estou perdido. Sem poder me expressar pela escrita , algo me falta; um teto, um chão, um caminho seguro, um lar. Sei não, mas acho que não sou mais. Não sou.